sexta-feira, 25 de julho de 2008

Preciso de alguém...



Que me olhe nos olhos quando falo. Que ouça as minhas tristezas e neuroses com paciência. E, ainda que não compreenda, respeite os meus sentimentos.

Preciso de alguém, que venha brigar ao meu lado sem precisar ser convocado; alguém amigo o suficiente para dizer-me as verdades que não quero ouvir, mesmo sabendo que posso odiá-lo por isso.

Nesse mundo de céticos, preciso de alguém que creia, nessa coisa misteriosa, desacreditada, quase impossível: a amizade.

Que teime em ser leal, simples e justo, que não vá embora se algum dia eu perder o meu ouro e não for mais a sensação da festa.

Preciso de um amigo que receba com gratidão o meu auxílio, a minha mão estendida. Mesmo que isto seja muito pouco para suas necessidades.

Preciso de um amigo que também seja companheiro, nas farras e pescarias, nas guerras e alegrias, e que no meio da tempestade, grite em coro comigo: "Nós ainda vamos rir muito disso tudo" e ria muito.

Não pude escolher aqueles que me trouxeram ao mundo, mas posso escolher meu amigo. E nessa busca empenho a minha própria alma pois, com uma amizade verdadeira, a vida se torna mais simples, mais rica e mais bela...

quinta-feira, 24 de julho de 2008

Por que a vida não precisa ser séria o tempo todo.


Tudo o que necessitei saber, aprendi com a minha mãe.

ME ENSINOU A APRECIAR UM TRABALHO BEM FEITO
- Se vão se matar, façam lá fora! Acabei de limpar tudo aqui dentro.
ME ENSINOU RELIGIÃO
- É melhor rezar para que essa mancha saia do sofá.
ME ENSINOU LÓGICA
- Porque foi eu quem disse! E por isso... é ponto final !
ME ENSINOU A PREVER O FUTURO
- Assegure-se de estar usando roupa interior limpa e que não esteja
esburacada para o caso de que tenha um acidente.
ME ENSINOU IRONIA
- Continue chorando e eu vou te dar uma verdadeira razão para chorar.
ME ENSINOU A SER ECONÔMICO
- Guarde suas lágrimas para quando eu morrer.
ME ENSINOU OSMOSE
- Fecha a boca e come.
ME ENSINOU CONTORCIONISMO
- Veja a sujeira que você tem no pescoço. Vira.
ME ENSINOU FORÇA DE VONTADE
- Voce vai ficar sentado até que coma tudo.
ME ENSINOU METEOROLOGIA
- Parece que um furacão passou no seu quarto.
ME ENSINOU MODERAÇÃO
- Já te disse um milhão de vezes para não ser exagerado.
ME ENSINOU O CICLO DA VIDA
- Te trouxe para este mundo e posso te tirar dele.
ME ENSINOU PADRÕES DE COMPORTAMENTO
- Deixe de agir como o seu pai.
ME ENSINOU O CIÚME
- Tem milhões de crianças menos afortunadas neste mundo que
não têm uma mamãe tão maravilhosa como a sua.
ME ENSINOU VENTRIOLOQUIA
- Não reclame! Fique calado e responda: Porque você fez isso?
ME ENSINOU ODONTOLOGIA
- Volte a me contestar e eu arrebento seus dentes na parede!
ME ENSINOU RETIDÃO
- Vou te endireitar com um tapa só.

GRAÇAS à MÃE!

Saudade


"Há momentos na vida em que sentimos tanto a falta de alguém que o que mais queremos é tirar essa pessoa de nossos sonhos e abraçá-la." [ Clarice Lispector ]
Saudades... mas, estou voltando pra casa outra vez... cheia de saudade morrendooooooooo de vontade de abraçar meus amores, meu cachorro... respirar o ar da minha casa, regar meu jardinzinho, aninhar na minha cama... ahhhh...!!! Nada melhor que nosso cantinho, nada melhor que sentirmos que somos importantes na vida das pessoas que amamos, nada melhor que ler repetidamente tão doce declaração de amor.
Amo Você!!!!!!!!

domingo, 20 de julho de 2008

"Nega-me o pão, o ar, a luz, a primavera, mas nunca o teu riso,
porque então morreria."
Pablo Neruda

Longe de casa


Longe de casa há mais de uma semana...
Milhas e milhas distante dos meus amores...


Blitz, rssss... a cara da minha adolescência, eu simplesmente adorava a irreverência de Evandro Mesquita e sua troupe, para quem não se lembra aquela banda de hits como Você não soube me amar,e etc que com um rock leve, letras bem-humoradas e performance teatral no palco, consolidou-se como fenômeno de massa lá pela década de 80. Ainda não se lembra? Então das duas uma: ou você estava perdido no Zimbabue ou morto, pois não conheço ninguem da minha geração que não tenha curtido Blitz, que não tenha dançado ao som da Blitz ou que não tenha colecionado aquelas figurinhas cafonas daquele cafonérrimo álbum da Banda. Mas não me lembrei da banda apenas por gostar, lembrei porque estou mesmo longe de casa e ganha um pão de queijo quentim quem adivinhar...
Saudade dos meus amores...

sexta-feira, 18 de julho de 2008

O que é ser amigo





Como será que podemos definir o que é ser amigo.
Mas, amigo, na verdadeira acepção da palavra, ou seja aquele que poderemos considerar como alguém que nos dedica um sentimento de carinho que extrapola qualquer outro sentimento?
Bem, certamente um amigo de verdade não será capaz de solucionar todos os problemas que tivermos, não poderá eliminar todas nossas dúvidas ou incertezas. Mas certamente será capaz de nos ouvir em nossos desabafos, ajudando-nos a pelo menos pensar em soluções, se as houverem. E a amizade só será completa, se houver reciprocidade de nossa parte quando a situação for inversa.
Um amigo não poderá mudar nosso passado, consertando nossos erros, nem acabar com nossos sofrimentos e dores, mas será capaz nos ajudar entender onde foi que erramos, para que mesmos enganos não sejam reprisados. E isso é muito importante, pois nem sempre somos capazes de descobrir porque algo não deu certo. Um amigo o fará, basta que saibamos escuta-lo, e que saibamos corresponder quando for nossa vez de ouvir.
Certamente não será amigo de verdade se nada falar para nos apontar um caminho errado que estamos trilhando. Embora possa nos desagradar, saberá indicar o que nos poderá acontecer de mal, se insistirmos nesse rumo. E deveremos saber discernir sobre seus caminhos também.
Reciprocidade sempre é exigível para a sobrevivência de uma amizade.
Nem sempre ele poderá evitar um tropeço nosso, mas poderá nos amparar quando nos ver caindo, amenizando o impacto da queda. Poderá nos estender a mão para nos ajudar depois, ao invés de simplesmente balançar a cabeça, como que dizendo: “eu te avisei...” Nem sempre sabemos ouvir a voz da razão, e preferimos seguir nosso impulso. E quando for a nossa vez, é lícito que ele espere a mesma atitude de nossa parte.
Um amigo pode não ser o responsável direto nossos êxitos, por nossa felicidade, mas saberá dela compartilhar, regozijando-se com nossa alegria, da mesma maneira que iremos participar de suas vitórias, de sua felicidade.
Não poderá, certamente, tomar decisões por nós. Contudo, poderá emitir sua opinião, poderá nos orientar em nossas dúvidas. Da mesma maneira deveremos proceder, quando a situação for inversa.
Com base na reciprocidade de nossa amizade, estaremos seguros de poder contar sempre com seu apoio e encorajamento, como certamente ele contará com nossa sustentação, se preciso for.
Com base na sinceridade do sentimento, mesmo que não possamos determinar nossos limites, de uma maneira total e completa, poderemos sempre dar-nos espaço mutuamente, possibilitando um crescimento. Permitindo nossa individualidade. Assim se vive com amizade, numa sociedade. Sem tolher movimentos. Sem interferir diretamente. Mas dando sinais de erros ou acertos.
Certamente por mais forte e sincera que seja uma amizade, certas dores não poderão ser evitadas. Nosso coração sempre estará sujeito a certos golpes inevitáveis. Simplesmente um amigo leal poderá, quando muito, nos ajudar a recolher os fragmentos, colocando-os no lugar.
E assim deveremos agir, se for o seu coração que estiver despedaçado. E se for o caso, choraremos juntos. Sempre é melhor contar com um ombro amigo nessa situação.
E essa amizade poderá ser encontrada em um pai, em um filho, em um irmão, num conjugue, ou mesmo em quem, embora não seja da familia, será ainda melhor do que se o fosse, por ser uma amizade sincera.
Amizade apenas exige sinceridade e reciprocidade e, claro, seriedade.
Não interessa muito saber quem e o que somos, basta que possamos nos abraçar, em nome de nossa amizade, e saber que poderemos sempre contar com essa amizade como um bálsamo que nos ajudará a aliviar certas dores, mas que também poderá festejar conosco nossa alegria.
Agora, com a certeza de nossa amizade, esquecendo quaisquer mágoas passadas, presentes ou futuras, vamos imaginar um circulo, dando-nos as mãos, e vamos viver mais UM LINDO DIA.

quinta-feira, 10 de julho de 2008

Et si tu n'existais pas


Et si tu n'existais pas
Dis-moi pourquoi j'existerais
Pour traîner dans un monde sans toi
Sans espoir et sans regret
Et si tu n'existais pas
J'essaierais d'inventer l'amour
Comme un peintre qui voit sous ses doigts
Naître les couleurs du jour
Et qui n'en revient pas

Et si tu n'existais pas
Dis-moi pour qui j'existerais
Des passantes endormies dans mes bras
Que je n'aimerais jamais
Et si tu n'existais pas
Je ne serais qu'un point de plus
Dans ce monde qui vient et qui va
Je me sentirais perdu
J'aurais besoin de toi

Et si tu n'existais pas
Dis-moi comment j'existerais
Je pourrais faire semblant d'être moi
Mais je ne serais pas vrai
Et si tu n'existais pas
Je crois que je l'aurais trouvé
Le secret de la vie, le pourquoi
Simplement pour te créer
Et pour te regarder

Et si tu n'existais pas
Dis-moi pourquoi j'existerais
Pour traîner dans un monde sans toi
Sans espoir et sans regret
Et si tu n'existais pas
J'essaierais d'inventer l'amour
Comme un peintre qui voit sous ses doigts
Naître les couleurs du jour
Et qui n'en revient pas.

terça-feira, 8 de julho de 2008

Você sabe reconhecer um chato?


Ser ou não ser chato, eis a questão

- Existem várias maneiras de ser chato, mas o chato escolhe sempre a pior.
- Chato não se aprende, se nasce;
- Se um chato se cala de repente é porque morreu;
- Uma pessoa brilhante pode ser chata, mas chato nunca é brilhante;
- A teimosia é a força de vontade do chato;
- Um CHATO nunca perde o seu tempo. Perde o dos outros.
- Todo CHATO tem cara de CHATO.
- CHATO só não ronca quando dorme sozinho.
- Um CHATO quando você diz a ele “tá errado” ele responde: “eu sei!”
- Normalmente os CHATOS começam dizendo : “Fica chato dizer isso, mas…”
- Toda pessoa tem seu dia de CHATO, mas o CHATO é CHATO todo dia.
- Todo CHATO cutuca.
- O CHATO quando está com tosse nunca vai ao médico e sim ao TEATRO.
- CHATO é o sujeito que fica mais tempo com você do que você com ele.
- O CHATO só fuma para filar cigarro dos outros.
- CHATO é aquele que pára de fumar para ficar chateando quem fuma.
- CHATO é o cara que vai com você na rua mas pára de 2 em 2 metros porque não sabe conversar andando.
- CHATO é aquele cara que conta tudo, tim-tim por tim-tim, e ainda entra em detalhes.
- CHATO é aquele cara que você fala : “Passa lá em casa !” e ele passa…
- Chato é aquele indivíduo que só vai ao cinema assistir a filme de mistério pra poder contar o desfecho pros outros;
- Chato é o indivíduo que diz pra você do outro lado da rua: “Vem cá!!”, quando a distância é absolutamente a mesma;
- Quando o chato chega em casa, a família dele finge que já está dormindo.

Aprenda a fazer bonito o seu amor…

Por Arthur da Távola

Talvez seja tão simples, tolo e natural que você nunca tenha parado para pensar: aprenda a fazer bonito o seu amor. Ou fazer o seu amor ser ou ficar bonito. Aprenda, apenas, a tão difícil arte de amar bonito. Gostar é tão fácil que ninguém aceita aprender.
Tenho visto muito amor por aí, Amores mesmo, bravios, gigantescos, descomunais, profundos, sinceros, cheios de entrega, doação e dádiva,mas esbarram na dificuldade de se tornar bonito. Apenas isso: bonitos,belos ou embelezados, tratados com carinho, cuidado e atenção. Amores levados com arte e ternura de mãos jardineiras.
Aí esses amores que são verdadeiros, eternos e descomunais de repente se percebeu ameaçados apenas e tão somente porque não sabem ser bonitos: cobram; exigem; rotinizam; descuidam; reclamam; deixam de compreender;necessitam mais do que oferecem; precisam mais do que atendem; enchem-se de razões. Sim, de razões. Ter razão é o maior perigo no amor.
Quem tem razão sempre se sente no direito (e o tem) de reinvindicar, de exigir justiça, equidade, equiparação, sem atinar que o que está sem razão talvez passe por um momento de sua vida no qual não possa ter razão. Nem queira. Ter razão é um perigo: em geral enfeia o amor, pois é invocado com justiça mas na hora errada. Amar bonito é saber a hora de ter razão.

Ponha a mão na consciência. Você tem certeza que está fazendo o seu amor bonito?
De que está tirando do gesto, da ação, da reação, do olhar, da saudade, da alegria do encontro, da dor do desencontro, a maior beleza possível? Talvez não. Cheio ou cheia de razões, você espera do amor apenas aquilo que é exigido por suas partes necessitadas, quando talvez dele devesse pouco esperar, para valorizar melhor tudo de bom que de vez em quando ele pode trazer.
Quem espera mais do que isso sofre, e sofrendo deixa de amar bonito. Sofrendo,deixa de ser alegre, igual criança.E sem soltar a criança, nenhum amor é bonito.
Não tema o romantismo. Derrube as cercas da opinião alheia. Faça coroas de margaridas e enfeite a cabeça de quem você ama. Saia cantando e olhe alegre.
Recomendam-se: encabulamentos; ser pego em flagrante gostando; não se cansar de olhar, e olhar; não atrapalhar a convivência com teorizações; adiar sempre, se possível com beijos, “aquela conversa importante que precisamos ter”, arquivar se possível, as reclamações pela pouca atenção recebida. Para quem ama toda atenção é sempre pouca. Quem ama feio não sabe que pouca atenção pode ser toda atenção possível.Quem ama bonito não gasta o tempo dessa atenção cobrando a que deixou de ter.

Não teorize sobre o amor (deixe isso para nós, pobres escritores que vemos a vida como criança de nariz encostado na vitrine, cheia de brinquedos dos nossos sonhos) :não teorize sobre o amor, ame. Siga o destino dos sentimentos aqui e agora.

Não tenha mêdo exatamente de tudo o que você teme, como: a sinceridade;não dar certo; depois vir a sofrer (sofrerá de qualquer jeito); abrir o coração;contar a verdade do tamanho do amor que sente.
Jogue pro alto todas as jogadas, estratagemas, golpes, espertezas, atitudes sabidamente eficazes (não é sábio ser sabido): seja apenas você no auge de sua emoção e carência, exatamente aquele você que a vida impede de ser. Seja você cantando desafinado, mas todas as manhãs. Falando besteiras, mas criando sempre. Gaguejando flores. Sentindo o coração bater como no tempo
do Natal infantil. Revivendo os carinhos que instruiu em criança. Sem mêdo de dizer, eu quero, eu gosto, eu estou com vontade.

Talvez aí você consiga fazer o seu amor bonito, ou fazer bonito o seu amor,ou bonitar fazendo seu amor, ou amar fazendo o seu amor bonito(a ordem das frases não altera o produto), sempre que ele seja a mais verdadeira expressão de tudo o que você é e nunca, deixaram, conseguiu, soube, pôde, foi possível, ser.

Se o amor existe, seu conteúdo já é manifesto. Não se preocupe mais com ele e suas definições. Cuide agora da forma. Cuide da voz. Cuide da fala. Cuide do cuidado. Cuide do carinho. Cuide de você. Ame-se o suficiente para ser capaz de gostar do amor e só assim poder começar a tentar fazer o outro feliz.

terça-feira, 1 de julho de 2008

Eu sei, mas não devia


Eu sei, mas não devia

Marina Colasanti

Eu sei que a gente se acostuma.
Mas não devia.
A gente se acostuma a morar em apartamento de fundos e a não ter outra vista que não as janelas ao redor. E porque não tem vista, logo se acostuma a não olhar para fora. E porque não olha para fora, logo se acostuma a não abrir de todo as cortinas. E porque não abre as cortinas, logo se acostuma a acender mais cedo a luz. E porque à medida que se acostuma, esquece o sol, esquece o ar, esquece a amplidão.
A gente se acostuma a acordar de manhã, sobressaltado porque está na hora.
A tomar café correndo porque está atrasado. A ler jornal no ônibus porque não pode perder o tempo da viagem. A comer sanduíches porque já é noite. A cochilar no ônibus porque está cansado. A deitar cedo e dormir pesado sem ter vivido o dia. A gente se acostuma a abrir a janela e a ler sobre a guerra. E aceitando a guerra, aceita os mortos e que haja números para os mortos. E aceitando os números, aceita não acreditar nas negociações de paz. E aceitando as negociações de paz, aceitar ler todo dia de guerra, dos números da longa duração. A gente se acostuma a esperar o dia inteiro e ouvir no telefone: hoje não posso ir. A sorrir para as pessoas sem receber um sorriso de volta. A ser ignorado quando precisava tanto ser visto. A gente se acostuma a pagar por tudo o que deseja e o que necessita. E a lutar para ganhar o dinheiro com que paga. E a ganhar menos do que precisa. E a fazer fila para pagar. E a pagar mais do que as coisas valem. E a saber que cada vez pagará mais. E a procurar mais trabalho, para ganhar mais dinheiro, para ter com o que pagar nas filas em que se cobra.
A gente se acostuma a andar na rua e ver cartazes, a abrir as revistas e ver anúncios. A ligar a televisão e assistir a comerciais. A ir ao cinema, a engolir publicidade. A ser instigado, conduzido, desnorteado, lançado na infindável catarata dos produtos.
A gente se acostuma à poluição. À luz artificial de ligeiro tremor. Ao choque que os olhos levam na luz natural. Às besteiras das músicas, às bactérias da água potável. À contaminação da água do mar. À luta. À lenta morte dos rios. E se acostuma a não ouvir passarinhos, a não colher frutas do pé, a não ter sequer uma planta.
A gente se acostuma a coisas demais, para não sofrer. Em doses pequenas, tentando não perceber, vai afastando uma dor aqui, um ressentimento ali, uma revolta acolá. Se o cinema está cheio, a gente senta na primeira fila e torce um pouco o pescoço. Se a praia está contaminada, a gente só molha os pés e sua no resto do corpo. Se o trabalho está duro, a gente se consola pensando no fim de semana. E se no fim de semana não há muito o que fazer, a gente vai dormir cedo e ainda satisfeito porque tem sono atrasado. A gente se acostuma para não se ralar na aspereza, para preservar a pele.
Se acostuma para evitar feridas, sangramentos, para esquivar-se da faca e da baioneta, para poupar o peito.
A gente se acostuma para poupar a vida.
Que aos poucos se gasta, e que, de tanto acostumar, se perde de si mesma.


Marina Colasanti nasceu em Asmara, Etiópia, morou 11 anos na Itália e desde então vive no Brasil. Publicou vários livros de contos, crônicas, poemas e histórias infantis. Recebeu o Prêmio Jabuti com Eu sei mas não devia e também por Rota de Colisão. Dentre outros escreveu E por falar em Amor; Contos de Amor Rasgados; Aqui entre nós, Intimidade Pública, Eu Sozinha, Zooilógico, A Morada do Ser, A nova Mulher, Mulher daqui pra Frente e O leopardo é um animal delicado. Escreve, também, para revistas femininas e constantemente é convidada para cursos e palestras em todo o Brasil. É casada com o escritor e poeta Affonso Romano de Sant'Anna.