quarta-feira, 24 de agosto de 2011

“Sempre perguntam a um escritor: «Por que você escreve?». Por que sempre aos escritores perguntam isso? Perguntem a um dentista porque ele obtura. Ou a um pipoqueiro por que ele vende pipocas e não diamantes? Já sei o que um piloto de avião diria. «Meu sonho, desde criança era voar», ele diria. Um comissário de bordo tinha esse sonho, mas descobriu, tarde, que não passa de um garçom, equilibrista de luxo e turbulências. Perguntei a ginecologistas por que escolheram a especialidade. Suas respostas nunca me satisfizeram, e nem seus sorrisos eram marotos. E, a um advogado civil, sempre pergunto por que não criminal. E, se eu insistir, ameaça me processar. Está bem. Também já me perguntei por que escrevo. Ser dono de um banco traria mais conforto. Herdar um seria mais cômodo. Roubar é arriscado. Dentista eu não seria. Menos ainda ginecologista. Vender pipocas não traz o conforto de quem possui um banco. Pilotar aviões, são muitos os botões. Não advogar nem engenheirar. Endinheirar-se é para os estressados. Médicos, dizem, curam estresse. E existe profissão mais estressante que médico? Existe. Cobrador, me disseram. Em especial onde a tarifa de ônibus é R$ 0,77. Por que fazem isso com cobradores? Catar moedas, ouvir reclamações quando falta troco e, nas curvas fechadas, se segurar com os centavos. A profissão mais idiota do mundo é a do motorista de elevador, o ascensorista. Faz algo que todos sabem fazer, colocar um elevador em movimento. Passa o dia sentado numa caixa fechada. Escuta conversas incompletas e piadas sem finais. E tem seus rins e fígado sempre em movimento. Um ioiô humano. A existência de ascensoristas só não é mais estranha que a da gravata. Ou alguém, em sã consciência entende porque laçamos tiras de pano estampado ao redor do pescoço? Existem hábitos inexplicáveis, como enfiar na boca um tubo com algodão na ponta, colocar fogo na outra ponta, chupar uma fumaça, inalar e soltar. Chamam isso de fumar. Dizem que mata. Faço isso há tantos anos… Coisas estranhas. Por que temos cachorros e gatos e vacas domesticadas que nos fartem de leite? Por que o zero está no final do teclado, e não no começo? Por que mordemos canetas e mascamos chicletes? Talvez por isso eu escreva, para que me respondam: Para quê?”.

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